por Nubor Orlando Facure.
Dr. Geraldo teve um dia atribulado sobrepondo-se ao seu trabalho rotineiro na clínica psiquiátrica que dirige.
Passou o dia em atividade febril.
Atormentado com o problema financeiro do filho Junior de 23 anos que estuda e mora com os pais e não trabalha.
Terminando o inventário da mãe que há dois anos o advogado tenta acordos diversos com a família.
Administrando processos trabalhistas na empresa que dirige.
Já passam das 21 horas quando chega em casa, exausto.
O Dr. Geraldo, velho psiquiatra do interior de São Paulo, mal consegue terminar o banho e se sentar à mesa para um jantar leve com a esposa quando se aproxima o filho caçula. É o Júnior que vai estender por mais um ano a Faculdade de Educação física e não consegue se fixar em empregos.
Esse filho pede um minuto do pai e começa a reclamar das dificuldades.
Diz estar sem dinheiro, o celular está sem créditos, precisa de roupas novas e tem de decidir a reserva do hotel onde vai passar o próximo feriado.
Os colegas estão insistindo para fazerem uma viagem de navio de seis dias.
E ele sem dinheiro ainda não confirmou se embarca ou não.
Dona Mariana, a mãe de Junior, cobra do pai para não demorar com os recursos que o menino precisa.
Nesses dias de tanta carestia ninguém suporta tanto tempo vivendo sem dinheiro, diz a mãe.
O velho psiquiatra propõe fazer um acordo com o filho.
Você passará uma manhã comigo ouvindo as queixas dos meus pacientes do dia.
Conforme combinado na quarta feira seguinte Junior estava ao lado do pai como ouvinte silencioso.
Vamos aos casos:
Entra o Sr. Armando.
Quais as notícias meu amigo?
Teve algum alívio?
Pouca coisa doutor.
Continuo as voltas com Renatinho, totalmente sem juízo, nada o faz deixar as drogas.
Há períodos que nossas discussões beiram a violência.
Fico amedrontado com os amigos da sua convivência.
Tenho de deixar nas mãos de Deus.
Se falar alguma coisa é briga na certa.
Sr. Devair.
Por que esse abatimento?
O que te faz sofrer tanto?
Pois é doutor.
Trago no rosto as marcas do meu sofrimento.
Vivo entre a depressão e a insônia rebelde.
As brigas com os irmãos e as cunhadas só aumentam.
Enquanto o Juiz não decidir sobre o inventário não teremos um minuto de sossego.
O ambiente é de cobiça, desconfiança e desencontros.
Sr. Nivaldo.
E daí seu Nivaldo?
Terminou o processo?
Que situação desagradável, essa demora é de enlouquecer.
É isso mesmo Dr. Geraldo.
Venho hoje lhe pedir para me facilitar mais uma dispensa do trabalho.
Permaneço indo e vindo nos tribunais.
A Empresa não abre mão das suas exigências.
A esposa agora vive no médico.
Os filhos cheios de reclamações na escola.
Não tenho mais cabeça para lidar com situação tão difícil.
Peço uma dose maior dos remédios e um novo atestado para continuar afastado do serviço.
Entra dona Guiomar aflita.
Meu esposo necessita nova internação.
Venho implorar sua ajuda.
Depois da bebida veio a pressão alta e o diabetes.
Os delírios e a agressividade voltaram.
Não se cuida e está completamente sem higiene.
Não se alimenta bem.
Mais de uma vez se perdeu na rua.
A última internação ajudou muito.
Espero que tenha vaga no hospital para lhe darmos nova chance.
Mais angustiada ainda entra dona Zilda.
Dr. Geraldo a decisão é difícil.
O senhor tem de me aconselhar.
O meu ex-esposo pede para voltar.
Ele me abandonou há 12 anos.
Aparecia duas ou três vezes por ano.
Nunca ajudou em casa – nem a mim nem a nossos dois filhos. Hoje estão na Faculdade graças ao meu trabalho.
Dona Zilda, qual a dificuldade em perdoar?
Pelo menos ele não te substituiu por outra.
Mas doutor, com meia hora de conversa dá para perceber que ele está inaugurando o Alzheimer.
Dr. Geraldo pede um minuto de dona Zilda.
Pense bem.
Análise duas situações.
O que seria de nós se Jesus nos virasse as costas a cada vez que adoecermos ?
O que o futuro trará como doença na sua velhice?
A consciência de termos cumprido com nosso compromisso de amor ao próximo ainda é nosso maior passaporte para entrarmos nos Reinos do Céu.
Lição de casa
Júnior permanece com o pai para almoçarem na clínica.
Então meu filho, algum comentário?
O filho cabisbaixo pede desculpas segurando as mãos do pai.
Hoje mesmo cancelo a minha viagem de cruzeiro.
Vou providenciar os créditos que preciso para completar a faculdade.
E enviar curriculum para encontrar um trabalho digno.
Tenho de assumir as rédeas antes que a vida me precipite num abismo sem volta.