por Joel Matias
Capítulo XIII
CARACTERES DO MILAGRE
Os milagres no sentido teológico
Etimologicamente milagre significa: admirável, coisa extraordinária, surpreendente. “Um ato do poder divino contrário às leis da Natureza, conhecidas“. Para a religião, o milagre tem origem sobrenatural, é inexplicável, insólito, isolado, excepcional. Se uma pessoa estiver aparentemente morta, com vitalidade latente e a Ciência ou uma ação magnética conseguir reanimá-la, para o leigo ocorre um milagre, mas para pessoas esclarecidas dá-se um fenômeno natural.
Muitos fenômenos foram levados a categoria de milagres até que a Ciência revelou novas leis, restringindo assim “o círculo do maravilhoso“, que não mais podendo se firmar no domínio da materialidade, refugiou-se no da espiritualidade. O Espiritismo ao demonstrar que “o elemento espiritual é uma das forças vivas da Natureza” atuando sobre o elemento material, estando também sujeito a leis, faz com que o maravilhoso deixe de ter razão de ser. Pode-se então dizer “que passou o tempo dos milagres“.
O Espiritismo não faz milagres
Sendo o Espírito a alma sobrevivente à morte do corpo, sua existência é perfeitamente natural, durante ou após a encarnação. Como o princípio espiritual e material “reagem incessantemente um sobre o outro“, formando um conjunto harmonioso, representam duas partes de um todo, “tão natural uma quanto a outra“.
Tanto encarnado como desencarnado o Espírito atua sobre a matéria através do perispírito. Quando desencarnado utiliza-se de um intermediário para sua manifestação: o médium, assim como um intérprete para quem não conhecesse determinada língua. Tal manifestação está sujeita a leis, tanto quanto os fenômenos elétricos, luminosos, acústicos, etc. que, enquanto não explicados pela Ciência deram origem a inúmeras crenças supersticiosas. Um efeito físico como o de uma mesa que se ergue e é mantida no espaço sem ponto de apoio é explicável pela ação de um fluído magnético submetido à ação de um Espírito, tanto quanto o gás hidrogênio contrabalança o peso de um balão que se eleva no ar. Como os fenômenos espíritas sempre existiram através dos tempos, entraram no domínio do sobrenatural, gerando crenças supersticiosas; explicados racionalmente, passaram ao domínio do natural. Atua o Espiritismo no campo da espiritualidade, demonstra o que é possível como também o que não é, deixando entretanto margem aos conhecimentos reservados ao futuro.
Analisando as manifestações da alma encarnada ou desencarnada (espírito), em que revela sua existência, sobrevivência e individualidade, chega o Espiritismo ao conhecimento da natureza e atributos da alma, bem como das “leis que regem o princípio espiritual“, de modo científico, evidenciando no entanto aqueles acontecimentos tidos como fenômenos sobrenaturais, resultantes da imaginação de fanáticos ignorantes ou ainda produzidos pelo charlatanismo.
A característica dos fenômenos espíritas é de serem a maioria das vezes espontâneos e independentes das ideias das pessoas envolvidas. Alguns podem, em dadas circunstâncias, ser provocados por médiuns conscientes ou inconscientes, revestindo-se portanto de capital importância os fenômenos espontâneos, como p. ex., o sonambulismo natural e involuntário, “visto não se poder suspeitar da boa- fé dos que os obtêm“.
Faz Deus milagres?
“Não sendo necessários os milagres para a glorificação de Deus, nada no Universo se produz fora do âmbito das leis gerais. Deus não faz milagres, porque, sendo, como são, perfeitas as suas leis, não lhe é necessário derrogá-las“.
Se realmente existisse o Espírito do mal (Satanás) com o poder de “sustar o curso das leis naturais” para seduzir os homens, então Deus não seria Onipotente e lhe faltaria a soberana bondade. Todos os fatos tidos por miraculosos são efeitos naturais causados por espíritos desencarnados ou encarnados, no uso de sua inteligência e conhecimentos adquiridos, para o bem ou para o mal, cfe. sejam bons ou perversos. Assim o demonstra o Espiritismo, explicando os fenômenos no campo do magnetismo, sonambulismo, êxtases, visões e aparições, percepções a distância, curas instantâneas, levitações, comunicações com o mundo invisível.
O sobrenatural e as religiões
As religiões não podem ter como fundamento o sobrenatural, sob pena de verem minadas totalmente suas bases à medida em que fatos tidos como miraculosos recebem explicação racional, levando-os do maravilhoso para o domínio do natural. Deve o maravilhoso ser substituído pelo princípio espiritual, “sem o qual não há religião possível“. As bases sobre as quais se assenta o Espiritismo são as imutáveis leis de Deus, às quais obedecem os princípios espiritual e material.
Em lugar de fazer-se acreditar em “pedras que suam sangue“, “estátuas que piscam os olhos e derramam lágrimas” o poder de Deus deve ser mostrado na infinita sabedoria que a tudo preside, na organização dos fenômenos da Natureza, na bondade e solicitude dispensada igualmente a todos, na sua previdência , no bem constatado após um mal aparente e temporário. O mal é obra do homem e não de Deus. Em vez de levar susto com as penas eternas, devem as religiões evidenciar a bondade divina, transmitindo a certeza de que se pode redimir e reparar o mal praticado. As descobertas da Ciência representam a revelação das leis divinas. Só assim serão os homens “verdadeiramente religiosos, racionalmente religiosos“.
Fonte: BOLETIM GEAE | ANO 10 | NÚMERO 434 | ABRIL DE 2002