por Nubor Orlando Facure.
1. Com a introdução do microscópio (1590), Marcello Malphigui, um médico italiano, em 1653 conseguiu ver “células” no cérebro que as chamou de glóbulos.
Dois séculos depois, em 1873, o termo “neurônio” foi criado pelo cientista alemão Waldeyer. Nessa época já ocorria a identificação das células em todos os órgãos e se estabeleceu a teoria celular que comprovava que todo tecido vivo era composto por unidades celulares.
2. O médico italiano, Camilo Golgi, usando uma tintura de prata conseguiu colorir isoladamente os neurônios permitindo enxergar os seus diversos formatos.
Imaginou os neurônios como um conjunto de células com suas ramificações abundantes formando uma grande rede.
Golgi recebeu o Prêmio Nobel em 1904.
3. O histologista espanhol Ramon y Cajal, por outro lado, usando as técnicas de Golgi, verificou que os neurônios são células de formato muito variado e individualizadas e, que, não há continuidade entre elas como propunha Golgi.
Provara Cajal que há uma pequena fenda entre um neurônio e outro.
Essa fenda foi nomeada de Sinapse (junção apertada) nome escolhido pelo fisiologista inglês Sherrington em 1897.
É aqui, nas sinapses, que ocorre uma intensa tormenta química quando um neurônio estimula os neurônios vizinhos liberando neurotransmissores.
Cajal recebeu o prêmio Nobel junto com Golgi num ambiente de animosidade entre eles (1906).
Enquanto o italiano Golgi entendia os neurônios como uma rede unida em uma peça única, o espanhol Ramon y Cajal defendia a ideia de peças isoladas, neurônios individuais em contato pela fenda sináptica sem continuidade entre eles.
4. Nas terminações dos axônios acumulam-se, nos seus pontos terminais, certas “vesículas” cheias de neurotransmissores.
Quando o neurônio é estimulado pela corrente de despolarização ocorrerá a entrada de cálcio no terminal axônico abrindo as vesículas e, liberando as substâncias acumuladas no seu interior.
Os neurotransmissores caem na fenda sináptica de onde atingem os “portões” receptores dos neurônios vizinhos.
Assim, de um neurônio para outro, o estímulo progride.
Otto Loewe, um farmacêutico austríaco, contava ter tido um sonho com um experimento usando o coração de sapos preservando o nervo vago.
Nesse experimento, quando posto em prática no seu laboratório, ele percebeu que um estímulo no nervo produzia a liberação química de uma substância.
Sua análise revelou que essa substância já fora descrita anos antes pelo seu amigo pesquisador Henry Dale.
Foi então, que se confirmou a existência de neurotransmissores sendo esse primeiro achado, a Acetilcolina.
Loewe e Dale receberam o prêmio Nobel em 1926.
A Acetilcolina atua, no coração, diminuindo seus batimentos.
Nos músculos, produzindo sua contração.
No cérebro, relacionando-se com atividade motora, sono, memória e aprendizado.
Tão importantes quanto os neurotransmissores são os seus receptores.
Cada receptor atende a um único neurotransmissor.
Mas, um neurotransmissor pode atuar sobre diferentes receptores.
Substâncias que abrem ou fecham os receptores para atuação dos neurotransmissores são chamadas de agonistas ou antagonistas.
Na musculatura do seu braço, a nicotina é agonista de receptor da acetilcolina enquanto o curare o paralisa.
No coração, o veneno chamado de muscarina é agonista produzindo bradicardia enquanto a atropina é antagonista produzindo taquicardia.
Grande parte dos medicamentos atuais atuam como agonistas ou antagonistas dos canais receptores no cérebro.
5. Cada neurônio libera, em geral, só um tipo de neurotransmissor.
Sabemos que já foram descritos cerca de 100 neurotransmissores, sendo os mais conhecidos a adrenalina, a noradrenalina, a serotonina, a dopamina, o glutamato, o gaba e os peptídeos.
6. Um mesmo neurônio produz efeitos diferentes conforme o neurônio vizinho que estimula, mesmo liberando sempre um único neurotransmissor.
7. Quando estimulado por um neurotransmissor, o neurônio produz um aumento na sua árvore de dendritos e cria novos portões de receptores nas sinapses.
Isso amplia muito os botões das sinapses expandindo os contatos com um número maior de neurônios vizinhos. Produzindo, assim, redes de conexões mais expandidas e construindo um dos fundamentos do nosso aprendizado.
8. Cada cérebro acolhe os estímulos que buscamos por escolha nossa.
Temos cada um de nós a opção de ouvir uma boa música, uma aula agradável, cantarolar, dançar, escrever um recado, abrir um bom livro ou saborear um sorvete.
Comportamentos e sensações são registrados nos neurônios e interpretados na mente.
As sensações são anotadas no corpo, projetadas no cérebro e interpretadas na mente.
Quando o estímulo atinge o neurônio, seu núcleo, constrói uma receita de proteínas com o RNA e depois o RNA mensageiro que é levado até aos retículos endoplasmáticos para nova transformação – entre esses retículos está o de Nilss situado no citoplasma, já fora do núcleo.
São nesses retículos proteicos, que a receita definitiva é reformulada visando construir “portões” nos receptores axônicos ajustados nos terminais sinápticos.
Cada “portão” pode abrir ou fechar para o neurotransmissor que o atinge.
Isso significa que ao fazermos a escolha desse ou daquele estímulo afetaremos a estrutura dos neurônios que vão recepcionar nossa mente.
Portanto, os neurônios de cada um de nós são desenhados pelas nossas escolhas.
9. Numa experiência criativa o psicólogo canadense Donald Hebb, em 1949, mostrou que neurônios que repetidamente se estimulam juntos, permanecem juntos.
Um estímulo num primeiro neurônio libera neurotransmissores na sinapse que estimula um neurônio vizinho.
Repetindo o estímulo várias vezes foi percebido, depois, que estímulos mais leves já produziam resposta no segundo neurônio.
Isso estabeleceu um trânsito, uma conexão, uma via de transmissão.
Esse experimento revela um dos princípios da aprendizagem.
A repetição reforça as ligações entre os neurônios favorecendo o aprendizado.
10. Nessa mesma linha de pesquisa Eric Kandel descobriu que um neurônio estimulado fica hipersensibilidade no início e depois desenvolve uma habituação.
Como se “acostumasse” com o primeiro choque e reage fracamente depois disso aos choques subsequentes.
Essa sensibilidade aumentada e a habituação fazem parte, também, da fisiologia do aprendizado.
Eric Kandel ganhou o prêmio Nobel no ano 2000.
11. A italiana Rita Levi Montalcin também premiada pelo Nobel em 1986, descobriu uma substância química que promove o crescimento dos neurônios expandindo a sua árvore de dendritos.
É o fator de crescimento neural.
Ela trabalhou durante nove anos no Brasil.
12. Após o nascimento ocorre a morte de grande número de neurônios permitindo a organização definitiva do cérebro adulto.
Alguns têm de serem eliminados para outros crescerem.
Depois da juventude só morrem os neurônios que sofrerem algumas doenças como o Alzheimer.
Antigamente se pensava que morriam neurônios à medida que envelhecemos.
Hoje sabemos que os neurônios permanecem vivos na velhice, talvez com menos conexões.
13. Neurônios em espelho
Em 1999, na Universidade de Padova, estudando no cérebro a atividade motora em macaco percebeu-se que as áreas motoras se ativavam no animal que fazia o gesto e, curiosamente, nas mesmas áreas de um macaco que observava o movimento no primeiro animal.
Esse fenômeno explicou a empatia que sentimos ao testemunharmos a atividade ou o sofrimento de uma outra pessoa ao nosso lado.
Lição de casa
A gigantesca população de neurônios que recebemos como dádiva da natureza, inaugura nossa vida mental com um padrão mais ou menos fixo.
A primeira lição do bebê humano é o aconchego e a sobrevivência.
A partir daí somos envolvidos pelos estímulos ambientais onde vamos aprender a fazer escolhas.
E o resultado dessas escolhas nos dará uma identidade própria de inteira responsabilidade nossa.