Carta Aberta ao Prof. Rivail

por Carlos Alberto Iglesia Bernardo

 

Caro Prof. Rivail,

Aproveitando neste mês de outubro as comemorações de seu aniversário de nascimento, gostaria de escrever-lhe algumas palavras em nome dos colegas do Grupo de Estudos Avançados Espíritas. O grupo também está comemorando seu aniversário, foi criado em outubro de 1992 e desde então tem se dedicado a reunir amigos no estudo da Doutrina Espírita pela Internet.

Inicialmente gostaria de parabenizá-lo pela data, que marca seu retorno ao plano terrestre em pleno século XIX, século de luzes incomparáveis em vários campos do conhecimento humano, e, que, graças ao trabalho que o senhor desenvolveu, também se destacou no estudo científico da mediunidade e das informações transmitidas através dela. Nós todos, que nos reunimos no GEAE e na infinidade de grupos espíritas que hoje se espalham por todos os continentes, nos consideramos alunos seus, adeptos da doutrina filosófica, cientifica e moral que apresentou no Livro dos Espíritos e nas demais obras que o senhor assinou com o nome de Allan Kardec.

Tenho certeza que o senhor se surpreenderia muito se tivesse visto, de seu escritório na Passage Sainte-Anne, em um momento de clarividência, o extenso campo de atividades que surgiria do seu trabalho. Instituições de todos os tipos e tamanhos ostentam em seus objetivos a fidelidade aos princípios de trabalho, tolerância e caridade que tanto marcaram sua obra. Desde instituições de ensino para infância até os abrigos aos desamparados, desde hospitais renomados até singelas obras de visita aos necessitados, desde assistência espiritual em sessões especializadas até a palavra amiga aos que perderam toda a esperança, desde cursos doutrinários até as palestras educativas, por todo o lado se vê um ritmo de atividades incessantes, buscando construir, pela instrução e pela reforma íntima, o mundo de regeneração que os espíritos previram.

Naturalmente continuamos seres humanos imperfeitos, em trabalho de burilamento na escola terrestre, e, por causa disso, ocorrem as vezes choques de interesses e de pequenas vaidades. Não é muito raro ver-se grupos que se dividem, principalmente após trocas de diretorias. Já se fizeram até anedotas sobre este fato, atribuindo a ele a grande quantidade de grupos existentes.

E no campo das ideias, parece que ainda não nos apercebemos que o mais importante não são as ideias, mas a forma de vivenciá-las. Que a melhor prova da validade de uma ideia é o quanto ela transforma para melhor os seus adeptos e não os quão acirrados são eles na sua defesa verbal. Apenas citando um exemplo, há um conterrâneo e contemporâneo seu, que por aqui tem dado muito “pano para manga”. A obra dele em si mesma é inofensiva, o senhor a conheceu e lhe identificou as falhas, endereçando as soluções corretas na Revue Spirite e na “A Gênese”, o pior é que há os que a admiram cegamente e os que nem podem ouvir falar dela. O assunto é tão velho, que um dos grandes pioneiros do Espiritismo no Brasil, o Dr. Bezerra de Menezes, já teve que lidar com o problema.

Há outras disputas ainda mais inúteis, como a que opõem os que defendem fortemente que o Espiritismo é uma religião e os que, com o mesmo ardor, não aceitam que o chamem assim. Como se os espíritos não nos tivessem advertido, logo no início do Livro dos Espíritos, que a escolha das palavras é um problema nosso e que há conceitos que são impossíveis de traduzir corretamente em nossos idiomas atuais.

Mas, enfim, cito estes pequenos contratempos, apenas para não passar-lhe a impressão errônea de que já consideramos aprendidas todas as lições que nos deixou. Tenho certeza de que o senhor, como pedagogo experiente que é, não esperaria realidade muito diferente desta.

Muito nos falta a aprender! Felizmente a comunicação mediúnica é uma garantia segura da Doutrina e os espíritos não tem deixado de nos recordar insistentemente as lições que o senhor transcreveu em suas obras. Principalmente os princípios morais, solidamente ancorados nas palavras de Jesus.

Neste tema do aprendizado não posso deixar de mencionar também a ciência espírita, que tem trazido provas renovadas da reencarnação, aprofundado o estudo do períspirito e dos fenômenos mediúnicos, inclusive da comunicação com os espíritos através dos meios eletrônicos, a chamada transcomunicação. Um exemplo extraordinário deste trabalho científico é a obra do Dr. Hernani Guimarães Andrade, que recentemente retornou ao plano espiritual.

Como curiosidade deixe-me citar que o Brasil reúne um bom número de espíritas. São ainda uma porcentagem pequena da população, mas muito atuante, já fizeram com que o Espiritismo se incorporasse a nossa cultura. Como exemplo disso posso dizer que palavras como mediunidade, reencarnação, lei de causa e efeito, etc… já se tornaram corriqueiras e até em novelas aparecem rotineiramente.

Outra curiosidade digna de nota, é que aqui em São Paulo, onde moro, existe uma “Rua Espírita”. Era originalmente a “rua do espírita” Batuíra, que lá viveu pelo início do século XX. Pessoa extraordinária, conhecida pelo muito que fez em favor do próximo, dirigiu um grupo que ainda existe. O grupo “Verdade e Luz”, na Rua Espírita, completará no ano que vem 100 anos de existência.

Não entrarei em detalhes sobre a Internet, tecnologia que usamos para nossos estudos, pois com certeza não terminaria tão cedo esta carta.

Digo-lhe apenas que é uma das melhores ferramentas que temos atualmente para comunicação e nem imagino o que o senhor faria se a tivesse a disposição na época da Codificação Espírita. Quem sabe teria criado uma versão eletrônica da Revue Spirite e talvez a utilizasse para estabelecer trocas de informações rápidas com os grupos que, seguindo o exemplo da Sociedade de Paris, se estabeleceram para estudo da comunicação mediúnica.

Estimado professor, perdoe-me a extensão das notícias, mas não é sempre que há uma oportunidade tão boa de escrever-lhe. Conto com a boa vontade dos amigos espirituais para que esta singela carta lhe chegue as mãos.

Do aprendiz, Carlos Iglesia

 


Fonte: Boletim GeaE, Número 464, outubro de 2003

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