por Carlos Alberto Iglesia Bernardo
Quem acompanha os noticiários provavelmente se pergunta onde estará a solução de tantos problemas que atormentam o indivíduo e a sociedade e se em algum tempo futuro ela será aplicada. De fato, a sequência de más notícias, de descalabros humanos e tragédias da natureza que se repetem diariamente, parece desafiar o mais otimista dos seres. Há, porém, uma distorção nessa percepção, o mal só é notícia porque impressiona, porque não é a regra, fosse de outra maneira, seriam as boas notícias, os atos bondosos, a atitude honesta que estariam nas manchetes. As centenas de milhões de que vivem do trabalho honesto, que levam vidas normais, que convivem bem em sociedade, não são manchete, da mesma forma que os dias de clima comportado ou a passagem tranquila das estações nas paisagens onde a ação desordenada do homem ainda não desestruturou os mecanismos da natureza.
Mas, ainda descontando-se essa distorção e evitando-se exagerar a extensão do mal, não se pode negar que vivemos em um mundo onde o sofrimento ainda está presente. Em alguma medida todos nós passamos por situações em que somos chamados a testar nossa capacidade de superar problemas e seguir em frente. Todos estamos aqui em aprendizado, atravessando provas que nos levam a novas conquistas ou reparando e retificando atitudes incorretas do passado. E o resultado depende apenas de nós. Não há um destino previamente escrito para cada um, nem tribunais divinos a decidirem a sorte dos mortais. Há sim uma ordenação moral no Universo que leva o ser a colher o resultado de suas ações e o impulsiona sempre a níveis maiores de sabedoria e fraternidade.
Através das vicissitudes da vida é que desenvolvemos as qualidades que nos farão um dia colaboradores de Deus na obra da criação. E, à medida que evoluímos, a vida se transforma ao nosso redor. A cada ser que se transforma para melhor, o mundo muda um pouco também, à medida que a maioria dos seres pacíficos e bons aumenta, a minoria barulhenta dos que ainda perseveram no mal perde força. A cracolândia dos noticiários só existe porque há indivíduos que por dinheiro não se importam em destruir a vida de seus irmãos e porque há irmãos nossos que não tem a mínima noção de seu potencial como espíritos encarnados e daí se deixam consumir nas ilusões passageiras do vício.
Respondendo a inquirição do parágrafo inicial, há sim uma solução para os problemas da Terra, bem como haverá época em que ela fará desaparecer da nossa humanidade as chagas do egoísmo e da ignorância, que são as raízes dos comportamentos equivocados que originam os males noticiados diariamente. Esta solução é a própria oportunidade de viver na Terra, passando pelas vicissitudes que mencionamos e evoluindo conforme citado. Depende apenas de nós, de nosso esforço pessoal, o tempo que levará para isto ocorrer. Quem estiver interessado em participar ativamente deste processo pode encontrar as diretrizes para isso expressas nas grandes religiões e filosofias do mundo. O caminho está indicado na filosofia de Sócrates e Platão, nos textos dos Vedas, nos sutras das escolas budistas, nos ensinamentos das várias denominações cristãs, nas tradições legítimas dos povos de todos os cantos do globo e, do século XIX para cá, nas comunicações mediúnicas. Por ser uma verdade universal, ela sempre foi percebida e traduzida por pessoas de todas as culturas e épocas.
O Espiritismo vê Jesus como modelo de conduta para o homem. O “Sermão da Montanha” resume os ensinamentos de Jesus e se nenhuma outra parte do Evangelho tivesse sobrevivido aos séculos ele sozinho ainda seria suficiente para fundamentar uma ciência completa do bem viver. Quem seguir as orientações seguras que estão lá, renovará o seu modo de pensar e de agir. Atuando de forma correta criará novos horizontes para si mesmo e despertará muitos outros pelo exemplo.
As drogas deixarão de ser problema no dia em que seus consumidores deixarem de procurá-las por terem descoberto que há coisas muito melhores para preencher sua vida. Quando o interesse pelo bem do próximo se sobrepor ao desejo do lucro, não haverá mais traficantes nem corruptos. A violência diminuirá de forma exponencial quando os violentos se conscientizarem de que ao fazer mal a outrem, seja ele um ser humano, um animal de estimação ou outro ser qualquer da natureza, estarão entrando em um caminho de dor do qual só sairão após terem resgatado todas suas ações, repondo como bem todo o mal que fizeram. Mesmo as catástrofes naturais deixarão de ter tanto impacto quando os homens perceberem que, agindo de forma correta no uso dos recursos naturais, respeitando os limites impostos pelas características físicas e geográficas, mesmo que contra seus interesses imediatos, estarão deixando de criar sofrimentos para si mesmos.
A forma de viver enaltecida por Jesus nas bem-aventuranças, mais do que uma obrigação moral, é o modo correto de viver a vida e leva a felicidade aqui e no além. Fora dela, no caminho largo do mundo, há apenas a repetição de comportamentos que levam aos tormentos refletidos nos noticiários. Que ninguém se iluda achando que pode burlar esta verdade, a pessoa pode até retardar seu progresso e insistir em cometer os mesmos erros vida após vida, mas, dia a mais ou dia a menos, perceberá que está adiando sua felicidade e perdendo tempo.
“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus“, disse Jesus (Mateus, 5:3) iniciando o sermão da montanha.
Situou assim, a humildade espiritual em primeiro lugar entre as virtudes que precisamos adquirir para merecermos a glória das almas redimidas (…). Por “pobres de espírito”, na acepção que Jesus empregou estas palavras, devem-se entender aqueles que, aspirando à perfeição e, comparando com o ideal a ser atingido o pequenino grau de adiantamento a que chegaram, reconhecem o quanto ainda são carentes de espiritualidade.
São bem-aventurados porque a noção que têm de suas fraquezas e mazelas fá-los lutar por aquilo que lhes falta, e esse redobrar de esforços leva-os realmente a conseguirem maior progresso espiritual (…)
A colocação da humildade de espírito, como a primeira das beatitudes, parece-nos, pois, não ser meramente fortuita, mas sim proposital, visto que a felicidade futura de cada indivíduo depende muito do conceito que ele faça de si mesmo.
Quem se imagina com perfeita saúde não se preocupa com ela, nem procura um médico para tratá-la. Também aquele que se presume sem defeitos, ou já se considera salvo, descuida da higidez de sua alma, e, quando menos espere, a morte o surpreenderá sem que tenha avançado um passo sequer no sentido da realização espiritual.
Rodolfo Calligaris, O Sermão da Montanha, 3.a ed. FEB: Rio de Janeiro, Brasil. 1974
Fonte: Boletim GEAE 548, Jan. 2012