4. Questões 10 a 12 Teoria científica, física e filosofia

10) O que é uma teoria científica? O que é uma lei física?

[Ademir] Pelo exposto acima, uma teoria científica confunde-se com a própria noção de paradigma. Por exemplo, a ideia e posteriores desenvolvimentos em evolução natural em biologia, constitui um teoria científica. O modelo padrão na cosmologia é uma teoria científica etc.

Uma lei física (ou lei da física) é um elemento de uma teoria científica. Uma lei não existe separadamente de um paradigma. Não tem sentido em falar da lei da gravidade fora da mecânica. Uma lei pode ser um princípio do paradigma ou lei complementar. Por exemplo, a lei de ação e reação é uma lei de princípio. Já a lei ou modelo quadrático para força exercida pelas molas é uma lei complementar. No Espiritismo podemos dizer que a evolução espiritual é um princípio, enquanto que aplicação particular dessa lei – a lei da reencarnação – é uma lei complementar. 


11) Aparentemente a física se preocupa em responder o “como é” do Universo e não o “que é”, muito menos o “porquê” dele? Qual a razão deste afastamento entre física e filosofia?

[Ademir] Rigorosamente falando, a visão do mundo específica gerada pelo paradigma só diz respeito (exclusivamente) aos fenômenos que ele pretende tratar. É possível que existam fenômenos comuns pertencentes a áreas diferentes – como no caso da física e da astronomia, da física e da biologia etc. Cada ciência assim trata esses fenômenos de maneira particular sendo que seus cientistas podem apresentar visões diferentes com relação ao tratamento de um problema específico. Um físico vê uma célula neuronal de forma diferente de um biólogo.

Dependendo do profissional – como indivíduo – é possível que emita opiniões diferentes em relação aos sistemas que pesquisem. A crença acaba dependendo muito da maneira particular de se ver cada sistema natural que, por sua vez, é orientada por cada paradigma particular. Mas, repetimos a crença não pode ser confundida com ciência pois é derivada como uma interpretação do paradigma. Esse por sua vez não específica como uma crença deva se formar.

As questões sobre o “porquê” dentro da física (por exemplo) carece de sentido justamente por não ter equivalente (ou não ser prevista) pelo paradigma. A tarefa principal da atividade científica é a adequação empírica da teoria ou modelo e a previsão de novos fatos. Para exercer essa tarefa, os elementos são dados como existentes, a cogitação de sua razão de ser está além dos objetivos do paradigma. 

Mas, a medida que a ciência evolui, as descrições da realidade tornam-se cada vez mais complexas. Em particular nasce uma ideia de que todos os fenômenos naturais poderiam ser “reduzidos” em sua essência a leis cada vez mais primitivas. Para orgulho dos físicos, todas as leis das outras ciências poderiam ser reduzidas às da física. 

Assim como as leis da química podem ser reduzidas às leis da física, as leis da biologia podem ser reduzidas inicialmente às leis da bioquímica que se reduzem as da física. E assim por diante, incluindo sistemas muito mais complexos como o indivíduo, família e países inteiros (adentrando nas áreas humanas). Esse exercício não é objetivo da atividade científica, ainda que alguns indivíduos trabalhem nesse sentido. Por extrapolação dessa possibilidade, chegaríamos no final com um conjunto de leis físicas – especificadas por um paradigma final – que seria capaz de explicar qualquer fenômeno natural sem referência à área de pesquisa. Seria uma base absoluta para o conhecimento a começar a admitir a proposição de “porquês” para sua fundamentação.

[Alexandre] Existe uma discussão sobre as razões pelas quais a física não lida com as “causas primárias”. Me parece que o problema é que esse tipo de causa – que leva a existência de Deus – não pode ser verificada através dos fatos. A ideia é que não podemos verificar se uma hipótese para a causa é verdadeira ou não. Creio eu que no caso de algo absoluto como é Deus, não será possível obter algum tipo de “prova”. 

Vou dar um exemplo da complexidade desse assunto. Mikio Kaku, no livro Hiperespaço, discute o princípio antrópico (que diz que as coisas existem por causa do ser humano). Uma das implicações dessa ideia é a existência de Deus. Existe uma constatação de que se as constantes do Universo fossem um pouquinho diferentes, a vida não existiria e nós não estaríamos aqui debatendo isso. Então, isso sugere a existência de um Criador. 

Mas, recentemente, também segundo Kaku, a partir da proposta de Hawking de que o Universo possui uma função de onda formada por contribuições de infinitos Universos paralelos. Um cientista de Harvard provou que as conexões entre esses infinitos universos além de serem responsáveis pela manifestação do Universo que nós conhecemos, eles seriam  responsáveis por essas constantes da física. Isso põe de lado, novamente, a ideia de um Criador. Isso mostra que não são afirmativas simples e diretas que atestarão a existência de Deus no ponto de vista científico. 

Logicamente que a gente sempre pode questionar qual a causa primária dessas coisas. Mas a dificuldade é que o uso de um argumento para dizer que Deus existe pode ser rebatido no futuro. 

Acho que a melhor forma de se responder a essa questão, foi dada pelos espíritos e discutida por Kardec. 


12) Dadas as respostas as questões acima, como seria possível enquadrar o “espírito” e o “plano espiritual” dentro das teorias e leis da física?

[Ademir] Minha opinião pessoal é de que, no momento, não há possibilidade de enquadrar conceitos como “Espírito” e “Plano Espiritual” no arcabouço teórico das leis da física. Acho igualmente improvável que se possa fazê-lo também com outras ciências tais como a Biologia ou Química. Acrescento que corre-se um risco muito grande em querer, a todo custo, fazer esse enquadramento de qualquer forma.

[Alexandre] Eu não enquadraria o “espírito” nas leis da física, pelo menos como as de hoje, mesmo com todo os progressos que tivemos no último século. Não considero ser consistente tanto com o Espiritismo quanto com a física atribuir ao princípio inteligente propriedades que são válidas para a matéria inanimada por mais que essas propriedades, estudadas pelas teoria modernas, gerem em nós a sensação de algo “místico”, “imaterial”, etc. 

Já a matéria fluídica que compõe o perispírito e o mundo espiritual poderiam, em princípio, ser estudadas utilizando-se ideias inspiradas pelos paradigmas da física. Mas isso não se faz de forma simples como expor as ideias que nos vem a mente e que parecem fazer sentido. É preciso estudar muito tanto as teorias físicas quanto os conceitos espíritas de modo a produzir algo consistente, isto é, sem contradições e que possa ser verificado por algum tipo de fato. 

Porém, num outro aspecto, eu sinto muita falta de estudos que caracterizem os fluídos espirituais como objetos macroscópicos para depois proporem-se modelos e teorias para a estrutura da matéria fluídica. O que temos visto é, por causa da “moda” de se falar em teoria quântica, vários autores propõem teorias para a estruturas dos fluídos de forma muito qualitativa sem possibilidade de analisar, por exemplo, o que Niels Bohr chamou de “principio de correspondência” que diz que a teoria quântica deve apresentar os mesmos resultados da teoria clássica nos limites macroscópicos. Se nem sabemos ao certo como os fluídos se comportam em quantidades macroscópicas como saberemos se uma proposta para a sua estrutura mais íntima é válida. As pessoas as vezes se esquecem de que a teoria quântica surgiu para explicar certos fenômenos em escala macroscópica (a história da radiação do corpo negro). 

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Fonte: Boletim GEAE 12(479), 03/08/2004

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