Possuidor de uma bagagem de conhecimentos acadêmica,
Allan Kardec não desconhecia que o termo Espírito era entendido
de forma diferente por autores diferentes nos diferentes ramos da arte, da
Filosofia e da cultura.
Um de seus primeiros cuidados ao escrever “O Livro dos
Espíritos”, foi definir para o seu leitor o que ele entendia por
alma. Nesta empreitada ele coloca frente a frente a concepção
de três tradições de pensamento: a materialista, a panteísta
e a espiritualista.
As Diversas Concepções de Espírito
As concepções materialistas não
aceitam a alma, ou entendem que o que se atribui a ela não passa
de propriedades do organismo humano. Os autores contemporâneos que
adotam esta posição podem admitir muitas variações
em torno do tema. Uns insistem que as faculdades humanas são produtos
do organismo e de sua hereditariedade, outros valorizam mais a influência
das experiências culturais na constituição do espírito
humano e outros admitem a construção da subjetividade na vida
social, mas todos eles entendem que as faculdades do indivíduo se
extinguem com a morte do corpo.
As concepções panteístas
propõem a indissociabilidade entre o conceito de Deus e do Universo.
Esta idéia central acomoda diversas variações, como a
idéia de um universo com consciência, a idéia de que Deus
é nada mais que o universo ou a idéia que postula que o universo
é apenas aparência, existindo apenas Deus. Rivail possivelmente
teve contato com as teses panteístas de Plotino, de Espinoza e com
as teses panteístas das doutrinas orientais, como as das doutrinas
hinduístas e as das doutrinas budistas. Com relação ao
Espírito, Kardec destacou uma das idéias panteístas que
afirmava que o princípio inteligente seria extraído de um todo
universal, ao nascer, e que após a morte retornaria a este todo, perdendo
sua individualidade “como as gotas de chuva no oceano”. A individualidade
seria, por conseqüência, uma ilusão a que estamos temporalmente
sujeitos.
A concepção espiritualista propõe
a existência de um “ser moral, distinto e independente da matéria
e que conserva sua individualidade após a morte”. Ela entende que a
inteligência e as outras faculdades psicológicas têm sua
origem neste ser distinto, e não são um mero produto do funcionamento
do organismo. Esta concepção abarca um grande número
de escolas de pensamento. Religiões como o catolicismo, os movimentos
protestantes, o islamismo e os cultos celtas são igualmente espiritualistas.
Como a esta idéia central, Kardec adicionou outras idéias que
ele colheu em comunicação com os espíritos, ele considerou
melhor criar um nome para este novo conjunto de concepções
sobre o Espírito, que denominou Espiritismo.
A Concepção Espírita
A concepção espírita que encontramos
na obra kardequiana, aceita a idéia geral espiritualista, exposta
acima, e lhe faz diversas contribuições. Allan Kardec desenvolveu
o conceito a partir de duas grandes fontes: a observação das
faculdades de médiuns e de sonâmbulos e o diálogo com
os espíritos que se manifestavam em suas reuniões e nas de
grupos com os quais mantinha contato.
Allan Kardec trabalha com duas definições
de espírito em “O Livro dos Espíritos”: o Espírito
como um princípio e os Espíritos como seres.
Como princípio 1,
o Espírito é a fonte da inteligência
2, das capacidades cognitivas, sem o qual um corpo não
possui consciência de si e do mundo ao seu redor. O codificador subscreve
a fala do seu interlocutor, que afirma que o Espírito é quem
“intelectualiza a matéria”3,
isto é, permite a existência do homem encarnado e dos animais
superiores, uma vez que estes últimos apresentam rudimentos de cognição.
Kardec afirma que a origem dos pensamentos reside além do corpo,
embora este seja o principal meio de comunicação das idéias
entre os espíritos encarnados. Este conceito de Espírito,
é uma abstração com fins pedagógicos, uma idéia
que explica a origem extracorporal da consciência de si, da individualidade
e da capacidade de pensar e de perceber sem a intermediação
dos órgãos dos sentidos. O Espírito, entretanto,
não existe, uma vez que ele só é encontrado no universo
revestindo algum tipo de matéria, seja a matéria densa (espírito
encarnado), seja a matéria sutil ou fluido universal em um estado
próximo ao primitivo (espírito desencarnado).
Como seres, os Espíritos 4
são os “seres inteligentes da criação”, que pré-existem
e sobre-existem ao corpo. São criados por Deus 5,
que os faz constantemente 6. Os espíritos
são criados em condições de igualdade, “simples e ignorantes”
7, dotados de potencial e liberdade de escolha para desenvolverem-se
8. Do seu relacionamento com os demais espíritos
e com a natureza sobrevém o desenvolvimento intelectual e moral. Não
se concebe no Espiritismo a existência de seres especiais criados para
a prática do mal (demônios) 9
ou para a prática do bem (anjos) 10.
No uso do livre arbítrio, entretanto, os espíritos escolhem
o que desejam fazer, podendo praticar atos de crueldade, intolerância,
mesquinhez e outros considerados maus ou atos de benevolência, caridade,
sabedoria e dedicação, considerados bons.
Enquanto o Espírito seria uma fonte irradiadora
11 de pensamentos, sem forma humana, os
Espíritos são encontrados envoltos por um perispírito,
um invólucro semimaterial 12 que
geralmente assume a forma humana, mas que é moldável pelas emanações
do Espírito.
Os espíritos (as pessoas consideradas mortas,
portanto) são capazes de se comunicar com os homens vivos (que denominamos
“encarnados”) através do pensamento, e se fazem perceber por algumas
pessoas que possuem uma capacidade especial denominada mediunidade. Os médiuns
são capazes de perceber, conseqüentemente, os Espíritos
(o Espírito revestido do perispírito) e suas
emanações (pensamentos, sentimentos, desejos, etc.).
A partir do tipo de pensamentos, intenções,
palavras e ações do cotidiano de um espírito, se lhe
qualifica a condição interior. Assim como os homens, há
diversos tipos de espíritos: ignorantes, pretensiosos, bondosos,
sábios, etc. Kardec propôs uma escala para classificar os espíritos
13, que auxilia ao estudioso e ao praticante
da mediunidade a identificá-los, preservando-os de acreditarem em tudo
o que dizem.
Allan Kardec também emprega o termo alma
para referir-se aos espíritos, mas restringe o seu emprego aos espíritos
encarnados 14, possivelmente para evitar
confusão.
Na concepção espírita os Espíritos
são perfectíveis 15, e
se reencarnam diversas vezes até que se tornem puros
16. O esquecimento aparente das experiências passadas
não se constitui um obstáculo ao desenvolvimento, uma vez que
a bagagem adquirida pelos espíritos continua influenciando-os sob a
forma de impulsos e de predisposições. Os espíritos não
se reencarnam imediatamente após a morte, permanecendo um tempo mais
ou menos dilatado no mundo dos espíritos 17,
estado este que Kardec às vezes denomina erraticidade 18
quando aplicado aos espíritos que ainda têm que reencarnar.
A alma tem por origem o princípio inteligente
19 que se encontra nos seres inferiores
da criação. Este princípio se “individualiza pouco a
pouco” e desenvolve as capacidades humanas, tendo “consciência do seu
futuro, capacidade de distinguir o bem do mal e a responsabilidade dos seus
atos”. Tendo, uma vez, desenvolvido as capacidades humanas, o princípio
inteligente pode ser denominado Espírito.
Um ponto importante desenvolvido pelo codificador diz
respeito às sensações e percepções dos
espíritos 20 e há todo
um estudo sobre a vida de relação com os outros espíritos,
os homens e a natureza quando os espíritos se encontram no intervalo
entre encarnações, cujo detalhamento foge ao escopo deste
trabalho.
O Trabalho dos Continuadores da Obra de Kardec
Os três continuadores franceses da obra de Kardec,
cujos trabalhos são mais conhecidos no Brasil são, sem dúvida,
Camille Flammarion, Léon Denis e Gabriel Delanne. Herdeiros do pensamento
kardequiano, estes autores obviamente continuaram dando tratamento de pesquisa
e reflexão sobre o tema do espírito. Sua abordagem, entretanto,
parece pautar-se em duas grandes diretrizes de trabalho: a realização
de pesquisas empíricas visando à comprovação
dos postulados espíritas e a ampliação do corpo teórico
baseada nestas observações e na análise da obra kardequiana.
Flammarion é o mais influenciado, principalmente
no início de sua obra, pelos postulados empíricos. Sua sonora
frase no túmulo de Kardec ecoou no movimento espírita de sua
época:
“
Os fenômenos físicos, sobre os quais a princípio
não se insistia, hão de tornar-se objeto da crítica experimental,
a que devemos a glória dos progressos modernos e as maravilhas da
eletricidade e do vapor.” (FLAMMARION, 1869)
Ele empreendeu, então um projeto sistemático
que residia em estudar fenômenos mediúnicos e anímicos
visando à demonstração de faculdades não explicáveis
a partir dos cinco sentidos. O leitor interessado irá encontrar em
“O Desconhecido e os Problemas Psíquicos” todo um estudo com base
em depoimentos que sustenta trabalhos como:
- A comunicabilidade entre moribundos e pessoas
vivas, à distância, através de percepções
não sensoriais;
- A insuficiência da tese alucinatória para
explicar os fatos de percepção à distância de
fatos verídicos;
- A existência de fenômenos de comunicação
com moribundos, de fenômenos telepáticos e de visão
à distância durante o sonho;
Ele conclui este livro afirmando, com base em sua casuística que:
“1o. – A alma existe como personalidade real, independente
do corpo;
2o. – A alma é dotada de faculdades ainda desconhecidas da Ciência;
3o. – Ela pode agir e perceber, à distância, sem os sentidos
como intermediários; (...)” (FLAMMARION, 1980, p. 270-271)
No livro “A Morte e seu Mistério”, este autor
desenvolve ainda mais os temas tratados em “O Desconhecido e os Problemas
Psíquicos”, mas é no livro “As Casas Mal Assombradas” que ele
irá tratar dos fenômenos de efeitos físicos, através
da apresentação de casos de “assombração” ou “poltergeist”.
Após a análise das evidências e a exclusão das
hipóteses alternativas à imortalidade e manifestação
dos espíritos, o astrônomo de Juvisy assim se pronuncia:
“Se o resultado dos nossos estudos
fosse negativo, comprovando que certas almas não se comunicam e mesmo
que não há senão manifestações fragmentárias,
ecos imperfeitos de Espíritos ainda ligados à vida terrena,
ou ainda produções pessoais inconscientes, não deixaríamos
de o proclamar com toda a franqueza.” (FLAMMARION, 1983, p. 272)
Gabriel Delanne dedicou-se à pesquisa e à
discussão teórica dos princípios espíritas. Ele
talvez seja o mais propositivo dos três continuadores. Quase todos os
seus livros tratam da questão do Espírito dentro da proposta
espírita, que inclui o perispírito, a reencarnação,
os estados sonambúlicos e mediúnicos, etc. Infelizmente os seus
mais densos trabalhos “As aparições materializadas dos vivos
e dos mortos” e “Pesquisas sobre a Mediunidade” ainda não estão
disponíveis para o público brasileiro interessado.
No livro “A Alma é Imortal”, ele discorre com
profundidade sobre o “envoltório da alma”, o perispírito. O
leitor encontrará uma síntese dos fenômenos apresentados
pelos pesquisadores do magnetismo animal, médiuns, aparições
e materializações estudadas pela “Society for Psychical Research”
assim como os trabalhos de “Albert de Rochas” e as fotografias de espíritos,
como base de sustentação empírica deste conceito kardequiano.
Após o debate das hipóteses alternativas ele conclui:
“A alma se encontra unida à substância
perispirítica, que coisa nenhuma pode destruir, visto que, pelo seu
estado físico, ela é o último termo das transformações
possíveis: ela é a matéria em si. (...) Somente a vontade
o 21 pode modificar, não,
porém, mudando-lhe a substância, mas expurgando-a dos fluidos
grosseiros de que se satura no começo de sua evolução.
(...) As vidas múltiplas são o cadinho purificador. A cada passagem
por ele, o Espírito sai do invólucro corpóreo mais purificado
e, quando há vencido as contingências da matéria, acha-se
liberto das atrações terrenas e desfere o vôo para outras
regiões menos primitivas.” (DELANNE, 1978, p. 288)
Em “A Evolução Anímica” ele agrupa
cinco ensaios sobre temas diretamente ligados à concepção
kardequiana de Espírito. Ele afirma as propriedades de organização
do corpo físico próprias do perispírito, comparando-as
à dinâmica do eletromagnetismo sobre alguns metais. Apresenta
inúmeros estudos que mostram a existência de capacidades humanas,
como a memória, nos animais, de forma rudimentar. A partir destes
fatos, ele argumenta em defesa de um evolucionismo espiritual, onde o perispírito
possui um papel de arquivo das aquisições do ser, que vão
sendo acumuladas sob a forma de automatismos nos reinos inferiores. A seguir
ele analisa estudos psicológicos, psicopatológicos e sobre
o sonambulismo e o magnetismo, para ampliar as suas considerações
sobre a memória humana. A seguinte frase sintetiza suas conclusões:
“O estudo do Espírito tem de ser feito, portanto,
abrangendo os seus dois aspectos: um ativo, que é o da alma propriamente
dita, ou seja, o que em nós sente, pensa, quer, e, sem o qual nada
existiria; outro, passivo – o do perispírito, inconsciente, almoxarifado
espiritual, guardião inalterável de todos os conhecimentos intelectuais,
tanto quanto conservador das leis orgânicas que regem o corpo físico.”
(DELANNE, 1992, p. 181).
Ele se detém na análise das relações
entre Espírito, perispírito e corpo, entendendo-os em interação
articulada, como se vê na passagem abaixo:
“Durante a reencarnação, o Espírito
está, pelo perispírito, tão intimamente ligado ao corpo,
que toda e qualquer modificação mórbida, na célula
nervosa do cérebro, equivale a uma alteração das faculdades
espirituais.” (DELANNE, 1992, p. 181)
Este livro prossegue com o estudo da atuação
do perispírito na formação do corpo e na origem das doenças
que nos acometem e na análise da loucura. Aqui ele afasta alguns obstáculos
postos pelos pensadores materialistas à hipótese anímica:
os instintos humanos encontráveis em todos os indivíduos, a
transmissão hereditária das doenças e o papel do organismo
na loucura.
Delanne propõe, em consonância com o pensamento
kardequiano, ser o Espírito, tendo como arquivo auxiliar o seu perispírito,
através do ciclo das reencarnações, quem ascende ininterruptamente
pelas manifestações da “vida vegetativa, orgânica e
psíquica”.
Estes temas são recorrentes em Delanne nas suas
outras obras: “O Espiritismo Perante a Ciência”, “O Fenômeno Espírita”
e “A Reencarnação”.
O terceiro continuador, mas não menos importante,
é Léon Denis. Sua obra é a mais filosófica e a
mais abrangente, se considerarmos as “frentes de trabalho” abertas por Kardec.
Ele acompanhou as contribuições que os pesquisadores empiristas
fizeram ao tema à sua época, mas não se restringiu a
eles, tratando a Doutrina Espírita em seu tríplice aspecto.
O tema do espírito aparece mais desenvolvido em
sua obra prima, “O Problema do Ser, do Destino e da Dor” e em “O Porquê
da Vida”, e de forma mais sucinta e tópica em outros trabalhos como
“Depois da Morte” e “Síntese Doutrinária e Prática do
Espiritismo”, “O Além e a Sobrevivência do Ser”.
Ele entende que a
Alma é:
“... o princípio de vida em nós. A alma do homem é
um espírito encarnado; é o princípio da inteligência,
da vontade, do amor, a sede da consciência e da personalidade.”
(DENIS, 1982, p. 21)
Com esta definição ele deixa claro que
não apenas a inteligência, mas as faculdades psicológicas
superiores e a própria personalidade repousam em um princípio
espiritual. Não há aqui uma contradição com o
pensamento kardequiano, mas uma afirmação clara das conseqüências
desta concepção de espírito.
Ele acata a idéia filosófica que aponta
uma dualidade de naturezas e entende que o homem participa das duas:
“O homem participa de duas naturezas: Pelo seu corpo,
pelos seus órgãos deriva-se da matéria; pelas suas faculdades
intelectuais e morais, procede do Espírito”. (DENIS, 1981, p. 22)
O que é o ser pensante (o problema do ser)?
Denis entende que o problema do ser é a alma.
“É a alma que fornece ao homem o seu princípio
de vida e movimento. A alma humana é uma vontade livre e soberana,
é a unidade consciente que domina todos os atributos, todas as funções,
todos os elementos materiais do ser (...)
... A dissolução das formas materiais
prova simplesmente uma coisa: que a alma é separada do organismo por
meio do qual comunicava com o meio terrestre.” (DENIS, 1979, p. 56)
Neste livro, Denis trabalha com duas propostas de sustentação
desta concepção de Espírito: a proposta filosófica
(calcada na lógica e na moral) e a proposta científica (calcada
nas evidências experimentais da existência e sobrevivência
da alma).
O apoio filosófico é desdobrado de dois
pressupostos: a incapacidade da matéria gerar qualidades que ela não
possui 22 e “a noção
do bem, gravada no fundo das consciências” 23.
O apoio científico é construído a partir de diferentes
linhas de pesquisa: Fenômenos considerados psicopatológicos,
como o desdobramento da personalidade, em análise detida, alteração
de faculdades dos sentidos e da cognição durante o sono, fenômenos
sonambúlicos, telepatia, manifestações de mortos (aparições
e materializações, especialmente), fotografias espíritas,
provas de identidade de espíritos pela via mediúnica, estudos
de fenômenos de incorporação e fenômenos incomuns
relacionados a memória são descritos e referidos por ele em
sua obra, mostrando que a crença na imortalidade da alma pelos espíritas
não repousa em considerações lógicas de ordem
metafísica e dogmática, mas como conseqüência racional
do exame de fatos pouco conhecidos pela ciência oficial de sua época
24.
Denis emprega o termo evolução (usado apenas
in passant por Kardec em “A Gênese”) referindo-se ao progresso da alma.
Seu conceito é importante por colocar a concepção espírita
da vida em plano diverso de outras concepções, como a epicurista
e as de algumas correntes de pensamento católico:
“O objetivo da evolução, razão de ser da vida,
não é a felicidade terrestre, como muitos erradamente crêem,
mas o aperfeiçoamento de cada um de nós, e esse aperfeiçoamento
devemos realiza-lo por meio do trabalho, do esforço de todas as alternativas
da alegria e da dor, até que nos tenhamos desenvolvido completamente
e elevado ao estado celeste. Se há na Terra menos alegria do que
sofrimento, é que este é o instrumento por excelência
da educação e do progresso, um estimulante para o ser, que,
sem ele, ficaria retardado nas vias da sensualidade. A dor, física
e moral, forma a nossa experiência. A sabedoria é o prêmio.”
25
Não entenda o leitor apressado que Denis faça uma apologia
da dor, ele apenas mostra como ela pode servir de instrumento para o aperfeiçoamento
humano, quando surge de forma inevitável no caminho das pessoas.
A Identidade do Espiritismo
Como se pode ver, a concepção espírita
é bastante complexa, o que justifica a proposta de se criar o termo
espírita e Espiritismo para circunscrever este amplo sistema de idéias.
O que é o Espírito é uma das questões
cuja resposta vai colocar o leitor na dimensão espírita ou fora
dela, dependendo do tipo de postulados que ele venha a defender. Deve ser
bem conhecida pelos que se interessam pela doutrina espírita.
1. Questão 23 de “O Livro dos Espíritos”.
2. Em “Definições Espíritas”, Kardec
qualifica o Espírito como sendo o “ser pensante”, em oposição
ao perispírito e ao corpo. (página 46)
3. Questão 25 de “O Livro dos Espíritos”.
4. Questão 76 de “O Livro dos Espíritos”.
5. Questão 81 de “O Livro dos Espíritos”.
6. Questão 80 de “O Livro dos Espíritos”.
7. Questão 115 de “O Livro dos Espíritos”.
8. Questão 127 de “O Livro dos Espíritos”
9. Questão 131 de “O Livro dos Espíritos”
10. Questão 128 de “O Livro dos Espíritos”
11. Questão 88 de “O Livro dos Espíritos”.
12. Questões 93 a 95 de “O Livro dos Espíritos”
13. Questões
100 a 113 de “O Livro dos Espíritos”
14. Questão 134 de “O Livro dos Espíritos”
15. Questões 114 a 127 de “O Livro dos Espíritos”
16. Questões 166 a 170 de “O Livro dos Espíritos”
17. Questão 84 de “O Livro dos Espíritos”
18. Questões 223 a 233 de “O Livro dos Espíritos”
19. Questão 607 a de “O Livro dos Espíritos”
20. Questões 237 a 257 de “O Livro dos Espíritos”
21. O autor está referindo-se ao perispírito.
22. Página
58.
23. Página 62.
24. Página 112.
25. Página 120.
Referências Bibliográficas
DENIS, Leon.
Síntese doutrinária e prática do Espiritismo.
Juiz de Fora: Instituto Maria, 1982.
______
O porquê da vida. Rio de Janeiro: FEB, 1981.
______
O problema do ser, do destino e da dor. Rio de Janeiro: FEB,
1979.
DELANNE, Gabriel.
A alma é imortal. Rio de Janeiro: FEB,
1978.
______
A evolução anímica. Rio de Janeiro:
FEB, 1992.
FLAMMARION, Camille.
A Morte e seu Mistério. Rio de Janeiro:
FEB, 1982.
______
As Casas Mal Assombradas. Rio de Janeiro: FEB, 1983.
______
O Desconhecido e os Problemas Psíquicos. Rio de Janeiro:
FEB, 1979.
KARDEC, Allan.
O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB,
1978.
______
Definições Espíritas. Niterói,
Publicações Lachâtre, 1997.
Retorno ao Índice
A viagem no tempo: uma restrição
espírita, Alexandre F. Fonseca, Brasil
Pela primeira vez um ensinamento espírita interfere
na interpretação de um estudo científico.
Quem não assistiu e se divertiu com a trilogia
“De Volta Para o Futuro” [
1] que encantou o mundo com
a romântica estória de um rapaz que realiza uma série
de viagens no tempo encontrando seus pais, no passado antes de se casarem,
a si mesmo e aos seus filhos, no futuro.
Divertimentos a parte, a verdade é que uma variação
no fluxo do tempo não só é teoricamente possível,
segundo a Teoria Geral da Relatividade de Einstein, como foi comprovada
experimentalmente. Apesar do assunto ser considerado, pelas pessoas em geral,
uma especulação sem fins práticos, alguns cientistas
tem levado esse tema a sério principalmente porque ele está
diretamente ligado à questão sobre as relações
entre causa e efeito, o que é extremamente relevante na pesquisa
de uma teoria unificada da Física. Tanto isso é verdade que
uma das mais conceituadas revistas de divulgação científica,
a
Scientific American, dedicou um número inteiro a questões
sobre o tempo. Desejo destacar o artigo intitulado “Como Construir uma Máquina
do Tempo” (original em inglês: “How to Build a Time Machine”) [2].
Nesse artigo, o físico teórico Paul Davies apresenta aos leitores
os mecanismos de uma viagem no tempo. Em suas próprias palavras Davies
afirma: “It wouldn’t be easy, but it might be possible”[
2,
3]. Cabe citar que três
físicos norte americanos publicaram na também conceituada
Physical
Review Letters [
4] uma proposta séria a
respeito do assunto. Motivado pelo interesse científico, mesmo que
teórico, sobre o assunto, pretendo, nesta matéria, comentar
sobre uma restrição do Espiritismo à questão da
viagem no tempo. Mesmo que do ponto de vista prático isso esteja muito
longe de acontecer, a discussão apresentada aqui tem um caráter
didático em ambos os pontos de vista espírita e científico.
Não há espaço suficiente para discutirmos
os detalhes sobre os mecanismos teóricos da viagem no tempo. As referências
citadas servem como guia ao leitor mais interessado em pesquisar o assunto.
Primeiramente, vamos expor em linhas gerais as condições em
que o tempo fluiria de forma diferente possibilitando uma viagem no tempo,
mencionando as evidências experimentais que suportam as pesquisas.
Em seguida exporemos uma restrição espírita à
viagem no tempo.
Basicamente, existem duas maneiras de se alterar o fluxo
do tempo, isto é, fazer com que ele passe mais devagar ou mais rápido,
quando comparado ao fluxo de tempo de um dado observador, por exemplo,
um homem parado numa estação de trem. Uma delas é mudar
a velocidade de um determinado objeto ou pessoa. Segundo a Teoria da Relatividade,
observadores que estejam em repouso (parados na estação de trem)
perceberão que o tempo fluirá mais devagar para aqueles
que estiverem se movimentando com relação a eles. A outra forma
de alterar o fluxo do tempo é aproximando-se, ou afastando-se, de
objetos com massa elavada. Segundo a Teoria Geral da Relatividade, o tempo
flui mais lentamente na proximidade de tais objetos massivos. Não percebemos
isso no nosso cotidiano porque as diferenças no fluxo do tempo apenas
se tornam significativas quando as velocidades de movimento são próximas
da velocidade da luz e porque estamos todos à mesma distância
média do nosso planeta.
A variação no fluxo de tempo foi testada
experimentalmente sincronizando-se dois relógios de altíssima
precisão e colocado-os, em seguida, em aviões que voaram por
muitas horas em sentidos contrários [
5]. O resultado
foi uma significativa diferença entre os relógios. Uma outra
verificação experimental foi um pequeno desvio na luz emitida
por átomos de hidrogênio que, segundo Hawking[
5], é explicado através de trajetórias
de elétrons no que ele chamou de
anéis fechados, isto
é, trajetórias no espaço-tempo que iniciam numa dada
posição e instante de tempo e terminam na mesma posição
e instante de tempo.
Antes de discutir a restrição espírita,
vejamos o que o professor Paul Davies comentou em seu artigo sobre certos
paradoxos de causa e efeito que a viagem no tempo proporciona. Considere a
situação em que uma pessoa viaja ao passado e tira a vida de
sua mãe. Isso cria um paradoxo pois se a mãe morre, ela não
terá aquele filho(a). Se o filho(a) não nasce, ele(a) não
poderá, após crescer, viajar ao passado para tirar a vida dela
e fica, então, claro o paradoxo. Segundo o professor Davies, esse
é um evento que não ocorreria por não ser consistente.
Seria como se tentássemos encontrar uma solução para
um anel circular de raio R que possuísse comprimento diferente
de 2pR, em nossa geometria usual. Por outro lado, ele
afirma que se uma pessoa viaja ao passado e salva a sua mãe, ainda
jovem, da morte, esse evento é perfeitamente viável e consistente.
Entre esses dois exemplos, existe um ponto importante que é o livre-arbítrio.
Ou a viagem no tempo interfere no livre-arbítrio, pois escolher entre
salvar e matar é puramente uma decisão nossa; ou, simplesmente,
esta viagem não é possível para os seres vivos. Não
temos esse problema com os objetos inanimados. A questão sobre o
livre-arbítrio é complexa nesses casos e mereceria uma análise
futura.
A restrição espírita que desejamos
ressaltar, porém, é outra. Considere a possibilidade de viagem
no tempo para uma época não distante seja no passado ou no futuro,
de modo a podermos nos encontrar mais jovem ou mais velho, respectivamente.
A situação pode ser caracterizada como havendo dois de nós
num dado momento. Do ponto de vista material, do corpo físico, não
há nenhum problema. No entanto, se lembrarmos que somos espíritos
encarnados estaremos numa situação de conflito com um ensinamento
dos espíritos. Segundo a questão número 137 do Livro
dos Espíritos [
6], o espírito não
pode animar dois corpos diferentes simultaneamente. No nosso exemplo, teríamos
dois corpos diferentes animados pelo mesmo espírito. Isso está
em contradição com a referida resposta dos espíritos.
De fato, a viagem no tempo ao passado, mesmo distante,
também gera o conflito acima. Imagine que a nossa viagem nos levou
a muitos séculos atrás. Suponha que nesta época estávamos
encarnados vivendo uma de nossas vidas passadas. O nosso espírito estaria
ligado a este corpo e ao corpo que veio do presente. Novamente temos a contradição.
Mesmo que não estivéssemos encarnados em tal época,
nosso espírito estaria no plano espiritual e não poderíamos
estar lá e encarnados no corpo que veio do presente ao mesmo tempo.
Já a viagem ao futuro nos parece possível,
pelo menos no ponto de vista da restrição anterior. Suponha
que nós entramos numa nave para viajarmos a uma estrela próxima,
digamos, 10 anos-luz de distância, a uma velocidade próxima
da luz. Após retornarmos ao nosso planeta, terá se passado muito
mais tempo na Terra do que conosco dentro da nave (o artigo [2] explica os
detalhes). Encontraremos, portanto, a Terra 20 anos no futuro. Nesse
caso, nosso espírito não esteve presente na evolução
espaço-temporal da Terra e em tal futuro, não encontraremos
um outro “eu” mais velho ou reencarnado pois estivemos na nave realizando
a viagem.
Do ponto de vista prático, a viagem no tempo ao
passado é algo impossível para objetos e seres de tamanho macroscópico.
Isso já não é verdade com relação aos
objetos de tamanho microscópico, como o elétron numa trajetória
tipo anel fechado acima mencionado. Nesse caso a restrição
espírita não apresenta nenhum problema pois tais objetos são
apenas materiais. De qualquer forma devemos ter em mente que há muito
o que aprender sobre as leis do nosso Universo.
Finalizando, eu gostaria de ressaltar a idéia
de que ao invés de ser confirmada pela ciência, pela primeira
vez, uma afirmativa espírita interfere numa análise científica
impondo restrições a um fenômeno considerado possível
e estudado seriamente pelos cientistas. Segundo Hawking [
7], talvez o fato de nunca termos recebido a visita de
um ser do futuro seja uma prova de que a viagem no tempo é impossível.
Entretanto, eu arrisco a dizer que a razão pela qual isso não
tenha ocorrido não seja somente devido às dificuldades científicas
e técnicas associadas à viagem no tempo, mas também porque
a restrição espírita apresentada nesta matéria
seja, de fato, um empecilho real ao fenômeno. É importante frisar
que isso é apenas uma opinião e não uma verdade comprovada
cientificamente. Mesmo assim, sinto uma admiração cada vez maior
pela Doutrina Espírita que demonstra possuir um potencial enorme de
informação e conhecimento que, verdadeiramente, nos ajuda a
progredir.
Referências
[1] Página oficial do filme na internet:
http://www.bttfmovie.com
[2] P. Davies, Scientific American,
September,
p.50, (2002).
[3] “Isto não seria fácil, porém
não impossível.”
[4] M. S. Morris, K. S. Thorne e U. Yurtsever, Physical
Review Letters
61, p. 1446 (1988). A revista Physical Review Letters
é uma das revistas científicas mais importantes na área
de Física.
[5] S. Hawking, O Universo Numa Casca de Noz, Editora
Mandarim, 2a. Edição, (2002).
[6] A. Kardec, O Livro dos Espíritos, Editora
Edições FEESP, 9a. edição, 1997.
[7] Citado por M. Kaku em Hiperespaço, Editora
ROCCO (2000).